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terça-feira, 23 de julho de 2013

Acrobacias culturais (sobre a primeira edição da Acrobata)




Teresina está passando por um lento processo de desguetização cultural. O aldeamento que a marcou, bem como ocorrera a outros centros culturais do país, começa a ressoar seus últimos ecos – e, assim, a literatura aqui produzida, a cultura em geral feita aqui, começa a ser pensada integrada aos dilemas e sucessos nacionais, diria mesmo globais. Com isso, não se nega a especificidade da produção local; nega-se, isto sim, que estejamos ilhados do resto do país e do mundo.

Em médio ou longo prazo, essa situação deverá galvanizar um debate em torno da velha noção de “Literatura Piauiense”. Precisaremos – penso que já precisamos, agora – reconsiderar o conceito de literatura regional, seja para precisá-lo seja para implodi-lo. Em curto prazo, porém, revistas como a dEsEnrEdoS, Revestrés e este belíssimo rebento chamado Acrobata vão capinando o terreno, devastando as ervas daninhas que criavam falsas cercas entre terrenos vizinhos. Claro que não se pode reduzir a importância de tais veículos a esse processo de desguetização cultural – mas, sem dúvida, aquela tarefa se conta entre as mais relevantes missões de tais veículos.

Embora debutante, Acrobata vem encabeçada por editores calejados de outras experiências culturais de relevo. Tom Jobim falou, certa vez, que o Brasil não é um país para principiantes; pois bem, se pensarmos especificamente no campo cultural, a frase do eminente músico ganha um sentido agônico. A experiência dos editores, portanto, é um dado relevante, que me faz acreditar que estamos diante de um empreendimento que terá boa longevidade. Não será fácil porque Acrobata surpreendente tanto pela qualidade dos textos como pela qualidade material, sem dúvida uma das mais revistas visualmente mais agradáveis de que tenho notícia no país.

Acrobata une criação e crítica numa dosagem perfeita, e com dois méritos extras. O primeiro é não se limitar à literatura, ainda que esta seja o epicentro da publicação; a segunda é que os ensaios ali presentes nem se excedem nos protocolos acadêmicos nem se restringem à mera reportagem informativa.

A perspectiva do veículo contempla principalmente a literatura de invenção, a arte mais experimental, mas nem de longe se nota em suas páginas ou nas palavras dos editores qualquer laivo de dogmatismo ideológico ou unicismo estético.

Cada um, a depender de seu temperamento e de sua formação, há de se agradar mais desse ou daquele texto. Trata-se, reforço, de um veículo plural. E com nada menos que uma centena de páginas. Entre muita coisa de boa cepa, e algumas poesias que não quero voltar a ler, destaco os poemas excelentes dessa ótima poetisa de São Tomé e Príncipe: Conceição Lima. Só ela já pagaria o preço da revista. Mas isso é só uma parte: há uma entrevista com Sergio Cohn que considero nada menos que histórica (o que não significa que eu concorde com tudo que se diz ali), um ensaio elucidativo de Nayhd Barros sobre Godard e um interessante depoimento de Edson Cruz sobre as revistas literárias no Brasil. Posso falar de outras surpresas boas de conviver, posso destacar o pagode da poesia promovido por Thiago E, a expressão exata do verso de Salgado Maranhão, a pureza lírica dos traços de Cícero Manoel. E, claro, não deixarei de mencionar que colaboro ali com um ensaio sobre “A cena poética de Teresina”.


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